Câmara de Ovar aliena toda a sua participação na ERSUC

O futuro da recolha de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU's) foi alvo de debate na última reunião da Assembleia Municipal, de 21 de Julho. Nesta reunião foi apresentada, por um lado, a proposta da Câmara Municipal de venda da sua participação no capital social da ERSUC e por outro uma moção que vinculasse o município a uma posição contrária à privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), apresentada pelo deputado municipal do PCP, Miguel Jeri.

Para o PCP, o sector dos resíduos é fundamental para o desenvolvimento do País e essencial para a preservação e conservação do ambiente, a coesão social e económica, a saúde pública e a qualidade de vida das populações. Um sector, que fruto da gestão municipal e multimunicipal e de enormes investimentos públicos conseguiu avanços notáveis, com uma taxa de cobertura de 100% e progressos significativos no campo da reciclagem, tratamento e valorização.

Ao longo dos anos, governos PSD e PS foram criando legislação sucessivamente mais permissiva à entrega a privados deste sector. Mas é em 2011, com o governo Passos/Portas, que é finalmente anunciada a entrega aos privados da recolha de RSU's, privatizando para isso a maior empresa do sector, a EGF.

A EGF é uma empresa pública que detém a maioria do capital em 11 empresas, incluindo a ERSUC onde detém cerca de 51,5%. As empresas do grupo EGF são responsáveis pela gestão dos resíduos em 174 municípios, processando 2,3milhões de toneladas de resíduos sólidos e servindo mais de 5,5 milhões de portugueses. Tem mais de dois mil trabalhadores, dispõe de modernas tecnologias e infra-estruturas à custa de avultados investimentos públicos, e movimenta anualmente cerca de 150 milhões de euros. É uma empresa altamente rentável, com lucros acumulados de 62 milhões de euros nos últimos 3 anos.


A opção do Governo pela privatização é injustificada a todos os níveis.

É injustificada no plano económico: a EGF empresa lucrou, só nos últimos três anos mais de 60 milhões de euros e é proprietária de equipamentos e infraestruturas que ascendem a várias centenas de milhões de euros em valor. O encaixe esperado com esta privatização não ultrapassa os 170 milhões de euros, o que é por si só ilustrativo da má opção que o Governo está a tomar. É uma privatização que, à semelhança das realizadas até aqui, não representa interesse público, nem económico, nem mesmo do ponto de vista das contas públicas.

É injustificada do ponto de de vista político: a privatização abre o caminho para a degradação da qualidade do serviço, subordina opções fundamentais de saúde pública, ambiente e ordenamento ao desígnio do lucro de acionistas privados, cria as condições para o aumento das tarifas cobradas aos municípios e aos cidadãos, e representa pouco mais do que 15 a 20 dias de gastos com juros da dívida que o Governo entrega a mãos alheias por se negar a defender o interesse nacional e renegociar a dívida.


Não é por acaso que esta privatização tem sido contestada por variados municípios em todo o país: de Loures a Condeixa-a-Nova, que apresentaram providências cautelares já aceites pelos tribunais, são dezenas de municípios que manifestaram o seu desacordo, incluindo, no Norte, Vila Nova de Gaia, Viana do Castelo, Arcos de Valdevez, Barcelos, Esposende, Ponte da Barca, Ponte de Lima, destacando-se, aqui no distrito, o exemplo de Anadia. Também sindicatos e confederações sindicais, como o STAL e a CGTP se manifestaram em diversas acções de luta, bem como numerosas associações ambientalistas, como a Quercus.

Permitir a privatização de uma empresa rentável como a EGF e a ERSUC significa aumentar as tarifas, diminuir a segurança e a qualidade ambiental, atacar os direitos dos trabalhadores, negar as contrapartidas aos municípios com consequências desastrosas para a economia ao constituir um monopólio privado.


A Câmara Municipal de Ovar optou por desresponsabilizar-se das suas competências ao vender a totalidade da sua participação na ERSUC

A CMO propôs-se vender a totalidade da sua participação na ERSUC, isto é, de 38864 acções, a troco de uma valorização prevista de 112% do seu valor, apresentando-a como um grande negócio. Por outras palavras, tendo o município investido 194.320€ em acções a 5€ cada, vende-as agora ao preço de 10,57€, obtendo uma majoração de cerca de 216.000€.

Mas uma decisão com profundas implicações políticas, económicas e sociais, não pode nem deve basear-se em simples operações contabilísticas. De facto os argumentos que a CMO tem para alienar a sua participação na ERSUC são extremamente pobres e o PCP tem todas as razões para denunciar esta operação escandalosa.

  1. Sendo de todo o interesse dos municípios lutar para que a recolha de RSU's se mantenha na esfera pública, o Município de Ovar, ao vender a sua participação na ERSUC, demonstra a sua conivência com uma privatização profundamente lesiva de todos os portugueses, incluindo os de Ovar. A decisão torna-se ainda mais condenável tendo em conta que neste momento foram já aceites duas providências cautelares visando a suspensão da privatização da EGF.
  2. A presença dos municípios no capital da ERSUC, ainda que minoritários mas com peso global relevante, tem peso nas decisões a tomar pela empresa. A CMO, ao vender toda a sua participação na ERSUC, está a abidcar totalmente desse poder interventivo, não assumindo as suas responsabilidades de controlo democrático e de representação dos munícipes de Ovar para o qual foi eleita.
  3. Mesmo entrando na lógica capitalista e privatizadora do PSD/CDS, e tendo em conta que na eventualidade da privatização da EGF se consumar esta será uma empresa altamente lucrativa, assistir-se-á muito provavelmente a uma valorização ainda maior das acções.
  4. A CMO, para se justificar em termos estritamente contabilísticos, recorre à comparação dos dividendos obtidos actualmente com a ERSUC com a de uma hipotética situação de investimento (do encaixe obtido com a venda de acções) numa conta a prazo. Contas feitas, com esta simulação a CMO demonstra obter uma diferença de 1700€ relativamente aos dividendos anuais da ERSUC, isto é, algo irrisório nas contas do município. Acresce o facto de ser altamente improvável a utilização do encaixe obtido numa aplicação financeira a prazo.
  5. De facto, a CMO contradiz-se e promete utilizar o encaixe "em programas sociais", chegando o Presidente da Câmara a acusar que os deputados que votassem contra este negócio de estar a votar contra a existência desses programas. Para o PCP configura uma chantagem inadmissível que um partido que no governo tem devastado as condições socio-económicas de milhões argumentando que "não haver dinheiro" para pagar salários, pensões e prestações sociais, venha acenar com programas sociais como moeda de troca para jutificar negócios ruinosos. O PCP, defendendo a necessidade de programas que minorizem as dificuldades dos portugueses, não aceitará que o sua financiamento tenha de ser à custa de negócios que são, directa ou indirectamente, a causa dessas mesmas dificuldades. Com a previsível subida de tarifas serão os munícipes a pagar, no futuro, este negócio.


A venda da totalidade das participação do município no capital da ERSUC acabaria por ser viabilizado com os votos a favor do PSD e os votos contra do PCP, do BE e do PS.

Ao mesmo tempo, moção do PCP contra a privatização da EGF seria rejeitada com os votos contra do PSD, e os votos a favor do PCP, do BE e do PS.

Ao votar assim, o PSD assume a atitude de, uma vez mais (e à semelhança do que havia feito com uma moção contra a privatização dos CTT apresentada pelo PCP) alinhar com as políticas governamentais de alienação do bem público, servindo interesses dos grupos económicos privados e ignorando os interesses do país e dos munícipes.

O avanço deste negócio ruinoso é da exclusiva responsabilidade do PSD, seja na Câmara onde propôs o negócio, seja na Assembleia Municipal cujos deputados o viabilizaram. O PCP apela a todos os habitantes do concelho de Ovar que se mobilizem em defesa dos serviços públicos do e no concelho, combatendo a estratégia do Governo e da Câmara Municipal. Nessa luta, podem contar com o PCP para que estes serviços, sucessivamente privatizados, voltem a mãos públicas.


Moção do PCP

Contra a Privatização da EGF